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LEGÍTIMA DEFESA E ELEMENTO SUBJETIVO

11/05/2021 - Fonte: ESA/OABSP

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LEGÍTIMA DEFESA[1] E ELEMENTO SUBJETIVO

 

1.      Neste artigo debater-se-á se o Código Penal brasileiro exige, ou não, a existência do elemento subjetivo para a caracterização da legítima defesa.

 

2.      Em outra oportunidade, o autor desse artigo articulou que:

 

 

 

7. A legítima defesa tem como fundamento, dessarte, permitir que os cidadãos resolvam, de modo adequado e sem a intromissão do senhor ‘Estado’, os conflitos havidos na vida gregária. É dizer, ocorrida a situação potencialmente conflituosa, têm os ‘agentes’ de que trata o art. 25, CP, a possibilidade de resolver, no próprio ato, o conflito. E isso feito, a questão está encerrada, resolvida — o uso da redundância é proposital. Por exemplo, uma pessoa, na calçada, empurra à outra, que, de seu turno, devolve o empurrão e ambas se retiram do local: o conflito está resolvido — resolvido e não decidido verticalmente pelo Poder Judiciário. Impõe-se, no ponto, o registro de que nem toda defesa necessária é legítima, mas toda a defesa legítima tem de ser necessária. Dado que a lei penal permite e a legítima defesa é um tipo permissivo, porque faculta a reação do sujeito passivo da agressão injusta, atual ou iminente a repulsa, moderada [proporcional, minimamente], à injusta agressão. No caso exemplificado, a agressão foi atual e o agredido usou um meio [recurso] proporcional igual ao meio utilizado pelo agressor e, sobretudo, disponível. Essa é a base maior da legítima defesa, isto é, a faculdade de resolução dos conflitos, pelos cidadãos, com moderação, sem a necessidade de interferência das autoridades e ou dos agentes estatais, que, por óbvio, não são onipresentes[2].

    

3.      O contratipo da legítima defesa estabelece que:

 

Legítima defesa

 

Art. 25 – Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

 

4.      No preceito, portanto, conforme acima destacado, não há – nem mesmo indiretamente –, qualquer menção à necessidade de o agente saber – ou ter conhecimento – que está atuando em legítima defesa para que se opere o afastamento da antijuridicidade – ou da ilegalidade, se se preferir – da sua conduta. E não é lícito ao intérprete inserir, no contratipo, palavras que nele não se contém. Merece destaque, ademais, que, conforme constou na citação do artigo anterior, o importante, para a caraterização da legítima defesa, é a faculdade de resolução dos conflitos, pelos cidadãos, com moderação, sem a necessidade de interferência das autoridades e ou dos agentes estatais, que, por óbvio, não são onipresentes. Significa dizer que se o conflito foi resolvido não há necessidade de se investigar se o agente sabia, ou não, que estava atuando em legítima defesa. Isto é, não se faz necessária a existência do ‘dolo invertido[3] para a consumação do tipo permissivo – ou do contratipo – a que se refere o art. 25, CP. Nesse sentido, analogicamente, por inafastável imposição sistemática e, mudando o que tem de ser mudado, incide o art. 14, CP, no ponto:

 

Art. 14 – Diz-se o crime:

 

Crime consumado

 

I – consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal.

 

5.      Recorre-se, assim, no particular, mutatis mutandis, ao autorizado magistério doutrinário de Rudolf Stammler, jusfilósofo alemão da Escola Neokantiana de Baden – um dos renovados da Filosofia do Direito contemporânea[4] –, que enfatiza que quem aplica um artigo do Código, aplica o Código todo. O que vale por dizer que o contratipo da legítima defesa se consuma quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal. Aí não contida, por evidente, a exigência do elemento subjetivo, porque, decerto, completamente estranha – e isso é inquestionável dogmaticamente –, ao comando legal do art. 25, CP. É bastante, assim, à caracterização do instituto da legítima defesa a existência do elemento objetivo. Assim, por exemplo[5], atua em legítima defesa, o atirador que essa citação está contida em diversos ‘Manuais’ nacionais e internacionaisdispara uma arma de fogo para matar uma pessoa agachada sem saber, todavia, que ela – a pessoa agachada – está matando, por estrangulamento, uma outra pessoa, no chão. E por que isso acontece? Porque o conflito se resolveu na forma da lei[6]. Mostrando-se inteiramente indiferente, então, no contexto ora assinalado, a existência, por parte do atirador, do elemento subjetivo.

 

Alexandre Langaro, advogado criminal. Autor de livros e artigos jurídicos. Estudou o NY Criminal Procedure Law em Nova Iorque

 



[1][Alexandre Langaro (https://esaoabsp.edu.br/Artigo?Art=172)].

[2][Idem. O original contém grifos e notas de rodapé].

[3][O ‘dolo’ de legítima defesa – existe isso?].

[4][Miguel Reale, Lições Preliminares de Direito, Editora Saraiva, 27ª edição, 2002, 11ª tiragem, 2012, pos. 575, Kindle, Amazon].

[5][[Conforme Eugenio Raul Zaffaroni, Lineamientos de derecho penal, 2020, Editorial Ediar].

[6][Idem].

 

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