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COMBATE AO TRABALHO INFANTIL E PANDEMIA: Providências de renda no Município de São Paulo

04/03/2021 - Fonte: ESA/OABSP

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COMBATE AO TRABALHO INFANTIL E PANDEMIA: Providências de renda no Município de São Paulo

 

Autoria: Mirele Ambrósio Maciel – Graduanda em Direito pela Universidade São Judas Tadeu

 

Vitória de Andrade Bolsarin – Graduanda em Direito pela Universidade São Judas Tadeu

 

Resumo: Este artigo aborda a eficácia das políticas de assistência pré-existentes e elaboradas durante a pandemia do coronavírus como contendoras da exploração da mão-de-obra infantil durante o período da crise, focalizando no município de São Paulo. Por meio do estudo da legislação pertinente, seu histórico e da análise do perfil socioeconômico dos responsáveis pelas crianças e adolescentes explorados.

 

Palavras-chave: Trabalho infantil. Pandemia. Condições Econômicas. Medidas adotadas.

 

 

Através da definição do trabalho infantil pelo art. 60 do Estatuto da Criança e do Adolescente e do Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Trabalhador Adolescente (2014, p. 6), há de se considerar a influência do nível econômico dos círculos os quais os infantes fazem parte sobre questões relativas à qualidade de vida, acesso à educação, a própria renda estável e sujeição à contextos de descuprimento do ECA. Evidente que situações de incerteza, tal como a pandemia da Covid-19, levam ao incremento da pobreza e da desigualdade social, por essa razão, a CEPAL em conjunto com a OIT divulgou em relatório (2020, p. 9) que cerca de 326 mil crianças e adolescentes seriam levados à situação de trabalho infantil.

 

 

Dos Programas de Transferência De Renda

 

Suzanne Duryea (2003, p. 3) esclarece que na circunstância de instabilidade, existem duas repercussões elementares, dentre as quais se destaca o efeito renda. Por meio deste, a crise ocasiona a redução ou perda da renda familiar e os menores estariam mais propensos a ingressar no mercado de trabalho.

 

Em pesquisa realizada pelo Fundo das Nações Unidas (2020) com uma amostragem de 52.744 famílias vulneráveis na cidade de São Paulo, constatou-se que o índice de trabalho infantil já vem apresentando aumento significativo nos meses de crise sanitária (o aumento é de cerca de 26% em dois meses entre os domicílios apontados no levantamento).

 

Diante disso, o Conselho Nacional da Criança e do Adolescente reiterou a importância das políticas de repasse de montante a esses agrupamentos familiares, pois detalhou em sua recomendação (2020, p. 4) a necessidade de “garantia de renda emergencial”. Inobstante, sugeriu a “instauração de um plano de renda básica universal, garantindo que todos as famílias brasileiras estejam amparadas pelas políticas de assistência social de garantia do mínimo necessário para sobrevivência e convívio social.”

 

Conforme o artigo 227 da Constituição Federal, com o princípio da proteção integral, houve uma diluição de responsabilidade entre o Estado, as famílias e a sociedade no que toca

  • concessão de direitos básicos às crianças e adolescentes, uma vez que passaram a ser vistos efetivamente como sujeitos de direito. O que levou o governo à busca pela adoção de medidas preventivas e repressivas, através de questões complexas e interdisciplinares que ultrapassam o caráter da pobreza.

 

Em 1994, foi realizado o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, evento com o objetivo de rever propostas alternativas ao combate. Durante o segundo período de 1996, foi lançado o Plano Vale Cidadania que posteriormente veio a se tornar o Programa de Erradicação e Prevenção do Trabalho Infantil (art. 24-C, LOAS).

 

Nesse panorama, até 2006, a transferência era própria do PETI, contudo, após o advento do Programa Bolsa Família, criado pela Medida Provisória 132/03, convertida na Lei 10.836/04, houve a integração entre os dois sistemas. Como este último se propõe a desenraizar a pobreza, acabou deixando em caráter secundário a coibição ao trabalho proibido; além isso a Lei 10.219/01 apesar de dispor sobre as práticas socioeducativas, não subsidiou a execução dessas ações e acabou por inchar o PETI.

 

Consoante informações do painel de monitoramento do Ministério da Cidadania, no mês de junho deste ano, 1.339.689 entidades familiares constavam como cadastradas na cidade. Um dos relatórios da ferramenta evidencia que “a execução muito baixa dos recursos transferidos pelo Índice de Gestão Descentralizada para os municípios no último ano (...) A deficiência compromete o resultado da gestão do cadastro e do Bolsa Família”.

 

Outro programa, no âmbito municipal, é o Renda Mínima, instituído pela Lei 14.255/06 cuida da complementação mensal da renda familiar, objetiva auxiliar o acesso às políticas assistenciais do governo e estimular a frequência escolar. De acordo com dados do Ministério da Cidadania, no município de São Paulo, em 2019, havia 101 famílias com pelo menos com algum membro em situação de trabalho infantil, enquanto que, apenas 74 famílias foram contabilizadas em estado de trabalho infantil e beneficiarias do Bolsa Família, evidenciado-se a necessidade de se levar em consideração, o que para Elisiane dos Santos (2017, p. 216) evidencia a situação de subnotificação de casos anotados no CadÚnico.

 

Justamente durante a crise ocasionada pela pandemia, ao reconhecer – por meio da Nota Técnica n° 70 do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – a dependência da situação socioeconômica das famílias de baixa renda, o Governo Federal providenciou a concessão do auxílio emergencial pela Lei 13. 982/20 como forma de “arcar com as despesas básicas das crianças e dos adolescentes sob suas responsabilidades (...) cerca de 30 milhões de infantes vinculados ao rendimento de terceiros para sobreviverem”. Tendo como público-alvo os beneficiários do Bolsa Família, os não beneficiários, mas inscritos no CadÚnico e os demais cidadãos que atendam aos requisitos; somente estes últimos não foram inscritos de ofício no repasse emergencial e aqueles que detinham o PBF tiveram o pagamento regular suspenso. A respeito da problemática envolta às condicionalidades de acesso, o Banco Mundial dispõe: “esse processo foi complicado pela falta de CPF e pela capacidade limitada dos escritórios locais de assistência social (CRAS) para inserir novos beneficiários”. Nesse sentido, por serem os auxílios desenhados para a manutenção da renda domiciliar, sem dúvidas, seu patamar deveria se encontrar em valores próximos a um salário-mínimo per capita. Para Cassiano Trovão (2020, p. 31), o dilema do repasse se encontra no fato de que:

 

A grande maioria da população afetada não dispõe de riqueza acumulada, pois tende a gastar todo o rendimento que aufere em bens de consumo básico, como alimentos. Portanto, o impacto negativo sobre a massa de renda tenderá a contribuir para a redução do consumo agregado de bens essenciais, acentuando a crise econômica.

 

 

Por outro lado, dentre as conveniências da renda emergencial, no Estado de São Paulo, consoante a PNAD-Covid19, é a de que 35% dos domicílios chegaram a receber a quantia, abrangência justificada pela cobertura do Cadastro Único. Outrossim, houve o importante reconhecimento normativo (artigo 2°, § 3° da Lei 13.982/2020) do direito a cota dupla às mulheres que administrem famílias monoparentais, desde que nesta haja um integrante menor de dezoito anos, critério que enfatiza a cautela do Legislativo com a tutela dos infantes e jovens.

 

No âmbito do Judiciário, vale ressaltar uma importante decisão liminar na ADI 6.357 MC/DF para que as leis acerca do orçamento público pudessem ser flexibilizadas com a finalidade de autorizar “gastos orçamentários destinados à proteção à vida, saúde e da própria subsistência de todos os brasileiros afetados por essa gravíssima situação (...) com medidas sócio econômicas protetivas”. A importância se deu a despeito do auxílio ser destinado aos responsáveis pelos infantes; e, nos demais benefícios, embora os Fundos da Infância e da Adolescência sejam fundos especiais, porque são vinculados a determinado propósito, sendo a criação de regras peculiares para sua vinculação mais flexíveis e tendo sua aplicação dotada em lei orçamentária.

 

Entretanto, há de se notar que da natureza temporária da transferência de um valor monetário em decorrência de uma conjuntura pandêmica desponta a percepção de que “sua capacidade de reduzir efeitos socioeconômicos perniciosos está concentrada em seu período de vigência.” (BARBOSA, 2020, p. 3) Com o término da Renda Básica Emergencial, a preocupação deve voltar-se a evitar o contexto crítico de privações que o programa estatal visou frustrar.

 

Ante o exposto, as políticas de transferência de renda, segundo nota técnica divulgada pelo IPEA, contribuem, de certa forma, para a redução da desigualdade. Tendo em consideração, principalmente as diversas questões econômicas e financeiras relativas ao tema, o Instituto demonstrou assente na Pesquisa de Orçamento Familiar realizada pelo IBGE, que a tributação pode ser um caminho alternativo para alcançar os impactos redistributivos desejáveis.

 

REFERÊNCIAS

 

BARBOSA, Rogério Jerônimo, PRATES, Ian.  Efeitos do desemprego, do Auxílio

 

Emergencial e do Programa Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (MP 936) sobre a renda, a pobreza e a desigualdade durante e depois da pandemia.

 

BM. Impactos e respostas de políticas públicas. Junho 2020. Disponível em:

 

<http://documents1.worldbank.org/curated/en/106541594362022984/pdf/COVID-19-in-Brazil-Impacts-and- Policy-Responses.pdf> Acesso em: 12 dez. 2020.

 

BRASIL. Ministério da Cidadania. Secretária Nacional de Renda e Cidadania. Bolsa Família

e             Cadastro              Único              no              seu              Município.              Disponível              em:

<https://aplicacoes.mds.gov.br/sagirmps/bolsafamilia/painel.html>. Acesso em: 20 nov. 2020.

 

CEPAL – Comisión Económica para América Latina y El Caribe; OIT – Organización Internacional del Trabajo. El trabajo en tiempos de pandemia: desafíos frente a la enfermedad por coronavirus (COVID-19), Coyuntura Laboral en América Latina y el Caribe, n. 22 (LC/TS.2020/46), Santiago, 2020.

 

CONANDA  –    Conselho   Nacional   da  Criança   e   do   Adolescente.   Recomendações  do

 

CONANDA para a Proteção Integral a Crianças e Adolescentes durante a Pandemia do Covid-19, 2020.

 

DURYEA, Suzanne; ARENDS-KUENNING, Mary. School attendance, child labor and local labor market fluctuations in urban Brazil. World Development, v. 31, n. 7, p. 1165-1178, 2003.

 

UNICEF. UNICEF alerta para aumento de incidência do trabalho infantil durante a pandemia em São Paulo. Publicada em: 18 ago. 2020. Disponível em: <https://www.unicef.org/brazil/comunicados-de-imprensa/unicef-alerta-para-aumento-de-incidencia-do-trabalho-infantil-durante-pandemia-em-sao-paulo> Acesso em: 22 dez. 2020.

 

TROVÃO, Cassiano José Bezerra Marques. A Pandemia da Covid-19 e a Desigualdade de

 

Renda no Brasil: Um Olhar Macrorregional para a Proteção Social e os Auxílios Emergenciais. Texto para Discussão. UFRN. DEPEC, Natal, n. 004, mai., 2020.

 

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