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Vitimização: A Mídia e a Violência Doméstica 1

23/02/2016 - Fonte: Maria de Fátima Cabral Barroso de Oliveira 2

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Este trabalho tem como objetivo o estudo da representação da identidade "mulher-vítima" na imprensa escrita, através da análise de dois textos jornalísticos publicados na década de 1990.3 A mídia, um instrumento valioso de pesquisa, contribui para que certos papéis dos gêneros sexuais sejam reforçados ou perpetuados. Entender como operam essas representações na sociedade patriarcal nesse momento histórico, onde por força das lutas pelas igualdades sociais foram materializadas várias mudanças jurídico-legais concernentes aos grupos excluídos, é de fundamental importância. Assim, busca-se examinar algumas das "verdades" construídas sobre a categoria "mulher", os seus estereótipos e os efeitos que causam quando as instituições trabalham com uma visão estereotipada dela. Investigamos, desse modo, como a mulher está representada em um contexto de criminalidade pela mídia e o seu reflexo no sistema legal e na criminologia.

1. Vitimização

In "woman" I see something that cannot be represented, something that is not said, something above and beyond nomenclatures and ideologies.

Julia Kristeva

De acordo com Shecaira (2004, p. 50), a vítima foi totalmente menosprezada pelo direito penal tendo ela recuperado o seu papel dentro do processo penal pelo surgimento dos estudos criminológicos. Então, podemos dizer que o discurso jurídico, através das várias mudanças dos textos legais, foi sendo alterado na medida em que o tópico da vitimização das mulheres foi inserido dentro do discurso criminológico e as teorias criminais passaram a considerar o gênero e as suas relações. Depois de vários séculos da vitimização da mulher na esfera privada ter sido desconsiderada, o sistema jurídico penal teve que se responsabilizar perante a sociedade que reconhece a violência contra as mulheres como forma de violação de direitos básicos e, portanto violação dos direitos humanos.

Na sociedade norte-americana, na década de 1990, o movimento ativista feminista promovia grandes campanhas populares de conscientização como, por exemplo, a campanha "Stop Violence Against Women" (Pare a Violência Contra as Mulheres) ou a "No Means No" 4 (Não Significa Não), que ditaram várias normas de comportamento - inclusive sexual - deixando claro que a violência contra as mulheres e, o próprio ato sexual, por assim dizer, havia passado da esfera privada e pessoal para a pública. No Brasil, a lei de número 11.340, de 7 de agosto de 2006, conhecida como a "Lei Maria da Penha", que trata do problema da violência contra as mulheres em sua esfera privada, ou seja, a violência doméstica, vai de encontro aos padrões legais internacionais da luta contra a discriminação e violência que afetam as mulheres. Já em 1995, a Conferência Mundial das Mulheres, realizada em Pequim, tinha considerado a violência contra as mulheres como "Área Crítica de Preocupação" e no parágrafo 113 da Declaração sobre a Eliminação da Violência Contra as Mulheres da ONU, encontramos a seguinte definição de violência:

O termo "violência contra as mulheres" significa qualquer ato de violência baseado no gênero sexual que resulte, ou provavelmente resultará em sofrimento físico, sexual ou psicológico, incluindo a ameaça da prática desses atos, assim como a coerção ou a privação arbitrária da liberdade, seja na esfera pública ou privada (tradução nossa).

Porém, uma das críticas tecidas ao sistema penal e à criminologia pelos teóricos da chamada criminologia feminista5 é justamente o fato da vitimização das mulheres ainda ser negligenciada; as criminologistas feministas alegam que a vitimização das mulheres não é muito levada em consideração pela criminologia dominante, mas que alguns dados estatísticos americanos não podem ser ignorados:

 

De acordo com o relatório do departamento de estatísticas canadense-StatsCan (2005), as mulheres foram acusadas da prática de 17% de todos os crimes cometidos no Canadá durante o ano de 2004, enquanto elas representavam 51% de todas as vítimas de crimes violentos relatados à polícia. No mesmo ano, 70% dos agressores, nos incidentes violentos cometidos contra as mulheres, eram seus parentes ou conhecidos.

As mulheres, além disso, são mais vulneráveis a serem vitimizadas pelo ex-parceiro ou atual, pelo ex-marido ou atual, ou por um membro da família. Constatou-se ainda que, de 1999 a 2004, tanto as mulheres quanto os homens experimentaram alguma forma de violência física ou sexual provocada pelo parceiro e que 653.000 mulheres haviam passado por algum tipo de violência que fora infringida por companheiros ou maridos; no mínimo, 60 mulheres morrem todos os anos nas mãos dos seus companheiros.

De acordo com FRENCH (1992), nos EUA, a cada doze segundos um homem espanca uma mulher, quatro mulheres morrem diariamente em consequência de espancamentos e o país tem um dos maiores índices de estupros em nível mundial, senão o maior. Evidentemente, a violência afeta a homens e mulheres, no entanto, ainda de acordo com os dados levantados, diferentes são as formas de violência a que se submetem e o impacto da violência causada pelo companheiro é mais sério para as mulheres do que para os homens.

FOX (2002), afirma que a visão ocidental de "mulher" e o tratamento a ela dispensado tem a ver com a influência das ideias religiosas da cultura judaico-cristã, da filosofia grega e do código legal do direito comum, uma vez que essas tradições assumiram a forma patriarcal como um sistema natural da vida em sociedade e os homens, sendo biologicamente e, portanto, "naturalmente" superiores, são aqueles que devem dominar e proteger. De acordo com a autora, essas ideologias justificaram um modelo de sociedade militar e patriarcal além de justificar também a violência contra as mulheres, assim, essa violência seria como uma expressão natural da dominação masculina e a nossa memória cultural carrega a representação de violência que está baseada na subordinação feminina. Corroborando essa visão, FRENCH (1992, p.21) menciona em seu trabalho, uma pesquisa psicológica realizada entre alguns homens americanos que consideraram os crimes de estupro e incesto como "normal", isto é, um comportamento masculino "natural".

2. A Mídia

Os textos da mídia são barômetros da transformação sociocultural, valioso material de pesquisa e representações da realidade (FAIRCLOUGH, 1995, p. 52). Dessa maneira a mídia, onipresente e influente força social, enfoca e reforça certos valores e imagens que são muitas vezes influenciadas pelas necessidades comerciais. De acordo com WOLF (1990), a imagem construída pela mídia, no período pós-guerra, foi a da mulher-esposa e dona-de-casa feliz; a mídia representava as mulheres nesse período como as "rainhas do lar", nascidas para a vida doméstica e a "feminilidade". Essa imagem servia aos interesses da emergente indústria de produtos eletrodomésticos que ignorava - ou tentava esquecer - os anos de guerra nos quais as mulheres desempenharam as funções ou assumiram papéis masculinos e clamava que elas voltassem para o "lar". Essa imagem foi superada pelo modelo da super-mulher, ou seja, aquela que é mãe, profissional, bela, magra e eternamente jovem, simultaneamente. Dessa vez, de acordo com a autora (op. cit.), a indústria da dieta e dos cosméticos estava por trás dessa objetificação, o chamado the beauty myth – o mito da beleza.

No começo da década passada, FALUDI (1994)6, causa grande sensação ao criticar a mídia por promover um backlash, uma verdadeira guerra contra os direitos que já haviam sido conquistados pelas mulheres nas décadas anteriores. A imprensa alardeava que as mulheres estavam voltando para os lares, uma vez que a experiência da "igualdade" tinha custado um preço muito alto a elas: muita independência e um feminismo "exagerado" contribuíram para uma jornada de trabalho exaustiva (agora elas trabalhavam fora e dentro de casa), a desistência da maternidade pela carreira profissional, a infertilidade, stress, a perda da "feminilidade"; enfim, a "masculinização" da mulher. A mídia, assim, perguntava se o feminismo estaria morto7, se teria falhado.

 

Mas, na década de 1990, a mídia volta a sua atenção para o tema "violência contra as mulheres", o que é considerado como uma das grandes conquistas do movimento feminista das últimas duas décadas justamente por denunciar as diferentes formas de agressões bem como a vitimização institucionalizada das mulheres. As norte-americanas, por causa do movimento feminista acadêmico e de ativismo social - forte e bem organizado -, desde a década de 1970 fazem um grande lobby para tornar visíveis as causas feministas. No entanto, apesar da grande visibilidade dada às questões "femininas" na década passada, o tema da violência contra as mulheres, principalmente nos jornais, parecia limitado à violência sexual ou às violências ocorridas dentro do contexto familiar, isto é, limitado a categorias que talvez mais conviesse ao formato de notícia per se e, portanto, ao que "vende" mais, "mascarando" as outras formas de violência (além da física ou direta) que também fazem parte do debate internacional, como por exemplo, a discriminação racial, a pornografia, a prostituição, o tráfico de mulheres e a pobreza extrema, temas que apareceram com bem menos frequência na mídia. Além disso, a década de 1990 produz um número considerável de histórias sobre mulheres más e violentas, confirmando determinados estereótipos femininos negativos.

A ocorrência de determinados eventos reforçam estereótipos e, vice versa; mais "forte" é o estereótipo, mais chances terão aqueles eventos de serem considerados "notícia" (FOWLER, 1991, p.17). Ao abordar os temas de violência contra as mulheres, a instituição jornalística muitas vezes se utiliza das histórias das "vítimas" em seus textos fazendo com que suas biografias pessoais venham a público a fim de que seja construída a narrativa do ato delituoso. A linguagem jornalística, ao utilizar argumentos romanescos na sua narrativa, apresenta personagens como vilões, heróis ou vítimas. Assim, os fatos noticiosos são tratados como meros conflitos entre forças antagônicas: uma força heróica e outra vilã.

Dessa maneira, não há como escapar de uma "construção" da identidade feminina como um recipiente natural da violência masculina, agente passiva e, portanto, sem agência. A mídia, ao apresentar a categoria "mulher" de forma homogênea e una, "congela" e "fixa" as identidades das mulheres como "vítimas", simplificando-as.

O jornal canadense The Toronto Star, publicou em 23 de março de 1996, um trabalho jornalístico investigativo sobre a violência doméstica para demonstrar como a sociedade canadense era inábil ao lidar com o tema de abuso entre os casais; uma das razões seria a total ineficácia do caro sistema judiciário. A instituição jornalística alegava que os casos de crimes de violência doméstica não eram "processados vigorosamente" - uma vez que poucos condenados recebiam penas privativas de liberdades -, e que os "resultados coincidiam com os desejos das vítimas" uma vez que muitas delas alteravam a história durante a fase processual em favor do acusado. Apesar da "violência doméstica" ser intolerável, ao mesmo tempo a sociedade tinha que arcar com os altos custos que envolviam as cortes de justiça, a polícia, a assistência legal, médica e os custos com o encarceramento; e em assim sendo, como os casos frequentemente não "chegavam a lugar algum" o dinheiro público estava simplesmente sendo desperdiçado.8

 

3. A Violência em Casa

Brian Skinner é um homem inocente. Aos olhos da justiça criminal de Ontário, o gerente de loja de 34 anos de idade, não bateu, sufocou ou tentou asfixiar a sua namorada. Os vizinhos que chamaram a polícia não testemunharam. No dia do julgamento, a vítima, uma garçonete de 19 anos, disse ao juiz que ela não se lembrava de nada. / O Star foi atrás de casos como esse e descobriu que agressões violentas estavam virtualmente sem a devida punição pelo sistema legal que tem se mostrado ineficaz para lidar com o problema efetivamente. As agressões eram violentas. As mulheres foram atiradas ao chão, agredidas a soco, golpeadas com vassouras, foram agredidas com telefones, cortadas com facas, sufocadas, asfixiadas, chutadas e estupradas. Elas foram ameaçadas de morte. / Tudo isso pelos maridos, namorados, e ex-amantes. / O estudo do Star encontrou um sistema de justiça falho durante todas as fases processuais, com juízes, promotores públicos, advogados de defesa e a polícia se eximindo de culpa.../ A polícia culpou os promotores. Os promotores culparam os juizes. Os juizes culparam a falta de dinheiro.

Como já dito, a instituição jornalística denuncia o sistema legal como ineficiente quando se trata de penalizar os agentes da violência contra a mulher. Mas, atente-se para o fato de o sistema legal não ser o único culpado pelas falhas: a comunidade (testemunhas) e a própria vítima são apontadas e responsabilizadas pelos defeitos do sistema jurídico-criminal. Nas asserções destacadas verifica-se que há uma mensagem moral ao leitor: a sociedade como um todo é culpada e, portanto, "todos" devem colaborar e "tudo" deve ser feito para que o "mal" nunca mais volte a acontecer, mesmo porque ele custa caro. Cria-se uma espécie de "pânico" na sociedade que pode gerar efeitos legais, como por exemplo, a alteração para uma legislação mais "dura" para os crimes de violência. A instituição jornalística se apresenta, assim, como a detentora da "verdade". Através do seu trabalho investigativo, ela chega à conclusão de que o sistema judiciário é "realmente" falho, quando se trata da punição dos agressores de mulheres e, algumas das razões para tal problema seriam:

 

133 casos de violência doméstica. 230 acusações. Esses números se referem a uma semana na cidade de Toronto. Na semana do Dia do Canadá, no último verão. Poucos acusados foram presos; a maioria recebeu um pouco mais do que um tapinha nas costas. E um caso após o outro desmoronou porque a vítima, muitas vezes coagida, mudou a sua história.

A utilização da voz passiva, recurso muito usado na linguagem jornalística, reforça a ideia de que a mulher não tem agência, ela sofre as ações sobre as quais não tem nenhum controle. Assim, a identidade feminina de "vítima" é reafirmada. Na afirmação destacada é passada ao leitor a ideia de que todos os processos criminais de violência doméstica resultam em fracasso jurídico-legal porque todas as vítimas mudam o depoimento durante a fase processual legal. As vítimas, desse modo, são "homogeneizadas" pela mídia: todas elas mudam a sua história , apesar do texto jornalístico mencionar a coação, este fato parece que não é levado em consideração; a vítima, coagida ou não, é responsável de qualquer maneira pelo fracasso do sistema. Dessa maneira, as mulheres que denunciam os maridos violentos deparam-se com um sistema jurídico que as revitimiza uma vez que a segurança e a liberdade não lhes são garantidas e as suas as condições sociais, culturais e a própria subjetividade delas (vítimas) são ignoradas. Como se percebe, há ainda uma espécie de "clamor" para que o leitor apoie uma justiça criminal mais "dura", pois a maioria recebeu um pouco mais do que um tapinha nas costas. Shecaira (2001, p. 357), citando Maria Lúcia Karam, nos diz que:

a publicidade do sistema penal, trabalhando com esta falsa ideia que reduz a violência à criminalidade convencional, explora o medo, criando um clima de pânico, de alarme social, a que costuma se seguir um crescimento da demanda de penas mais rigorosas, clima este que desencadeia e é alimentado pelas chamadas campanhas de lei e ordem. Tais campanhas manipulam emoções, selecionando e propagandeando alguns crimes mais cruéis, para, assim, produzir e generalizar uma indignação moral contra os que são identificados como criminosos.

Isto se reflete no artigo conclusivo do encarte:

Retaliando em São Diego – Esta cidade do sul da Califórnia está ganhando a batalha contra a violência doméstica – através do uso de toda a evidência possível. Os promotores lá preferem que as vítimas não testemunhem. / Baseia-se na premissa de que as vítimas principalmente mulheres – são testemunhas relutantes e não confiáveis nos casos de crimes domésticos por causa da complexidade emocional que envolve esse tipo de crime. Assim, elas raramente são obrigadas a testemunhar contra os seus agressores. Ao invés disso, o trabalho de mandar o acusado para a cadeia é deixado nas mãos da polícia e dos promotores, que desenvolveram o método das "três pontas" do processo criminal. E está dando resultados... Os advogados de defesa sabem que os promotores e a polícia estão juntando evidências e não se afastando dos casos se a vítima não coopera. Como resultado, a grande maioria dos acusados admitem a culpa. / O modo de ação da chamada ação processual sem vítima de São Diego inclui:

Fotografias. A polícia tem que tirar fotos dos ferimentos da vítima. Os policiais que fazem a ronda pagam por suas próprias câmeras fotográficas e as carregam no porta malas de seus carros.

Gravações "911". Se a vítima ligou para o telefone de emergência da polícia, essa primeira chamada é usada no processo criminal. Essas gravações sempre fornecem evidências do terror e histeria da vítima. Em muitos casos, são as crianças que fazem a ligação.

Testemunhas. Os promotores ‘coletam’ o maior número de testemunhas possíveis – polícia, vizinhos ou membros familiares. Durante o julgamento, a polícia é chamada para testemunhar, descrevendo o comportamento e as declarações iniciais da vítima. O que a vítima diz no momento do crime – ‘Me ajude. Ele está tentando me matar’ - são chamadas de ‘declarações espontâneas ou enunciados’. E eles são úteis quando as vítimas mudam a sua história negando a agressão sofrida. Previamente, os promotores tinham muita dificuldade em admitir como provas essas declarações porque os juizes consideravam-na prejudiciais. Essa abordagem de "tolerância zero" para os crimes de violência doméstica, fez com que San Diego ficasse conhecida como uma das jurisdições mais rígidas de toda a América do Norte para aqueles acusados de agressão contra os seus parceiros. Ao considerar San Diego como um exemplo a ser seguido, a instituição jornalística apresenta a solução para o grave problema da violência doméstica, isto é, como condenar o réu com base no exemplo californiano. Naquele Estado americano, como percebido, as mulheres não são obrigadas a testemunharem contra os seus parceiros e, portanto, estão isentas da responsabilidade de "agir" e de serem consideradas as "culpadas" de uma possível condenação penal de seus agressores. As instituições policiais e jurídicas cumprem a função de proteger e decidir pela mulher-vítima sem que esta precise sequer se manifestar. Constata-se que se apela para o velho estereótipo da irracionalidade e da histeria femininas, fatores que não as qualificam como testemunhas "sérias". Outra voz nos traz a lembrança de que à mulher não cabe a decisão, ou decisões importantes: o "certo" ou o "melhor" para elas já está ou estará decidido, pelo "pai", quer seja este aquele biológico ou aquele que é representado pelo "marido" ou pelo Estado. Eles a protegerão, agindo e falando "por" e "em" nome delas, quer na esfera privada, quer na pública.

Infame. Sem remorsos. Detestado. Disfuncional. Desviante. Notório. Cliente. Testemunha. Acusado. E um Assassino.

No final da década de 1980, uma série de estupros vinha ocorrendo na cidade de Toronto e suas imediações, e a polícia torontoniana tentava descobrir - o que levou alguns anos – o "estuprador de Scarborough". O caso finalmente foi resolvido em 1993, depois que o estuprador, Paul Bernardo, se tornou ousado o suficiente para sequestrar e assassinar as adolescentes Leslie Mahaffy e Kristen French, despejando os seus restos mortais no lago Gibson. Vários fatos ligados aos crimes praticados pelo estuprador chamavam muito a atenção tanto da mídia quanto do público; um deles era o de que a esposa do criminoso, Karla Homolka, foi acusada de participar dos delitos do marido. A horrível narrativa criminosa fascinou a mídia – que fez com que a dupla se tornasse internacionalmente conhecida como "Ken e Barbie da mutilação e do homicídio" -, principalmente pelo intrigante "personagem" Karla. Como se vê no texto jornalístico:9

Ela tinha tudo o que ele queria em uma mulher bonita, um corpo maravilhoso, ingênua, confiável, alguém que ele podia controlar, dominar e usar como um brinquedo sexual – e mais tarde transformá-la em uma parceira dos seus crimes. Ela, por outro lado, estava procurando por um homem confiante, seguro, que tivesse a capacidade de dar para ela um padrão de vida alto com a qual ela sonhara toda a sua vida. Seria justo dizer que ela não sabia no que estava se metendo.../ ele controlava todos os aspectos da vida dela / ele a estava moldando / Homolka estava tão cega de amor por causa de seu amor por Bernardo. No julgamento dele, Homolka disse que tinha concordado com todas as suas demandas porque ela queria, desesperadamente, agradá-lo. / Ela estava preparada para experimentar qualquer coisa que ele quisesse – estar disponível para o sexo todas as vezes que ele quisesse, ajudá-lo a pegar jovens virgens, até mesmo ajudar a encobrir assassinato.

Paul e Karla pareciam um casal canadense perfeitamente "normal" e feliz: jovens, bonitos e de classe média. A mídia descrevia Karla como uma moça ingênua, que acreditava em amor à primeira vista, em construir um casamento sólido e duradouro. Atente-se para a maneira como a identidade feminina é representada pelas palavras destacadas do texto: bonita, corpo maravilhoso, ingênua, alguém que ele podia controlar, dominar, usar como um brinquedo sexual. Dois imaginários encontram-se: ela representando o ideal "feminino" no imaginário masculino e ele o masculino no imaginário feminino. A "personagem" Karla é construída como um exemplo da submissão que, completamente cega de amor, atende a todos os desejos do marido. As frases ele controlava todos os aspectos da vida dela não deixa dúvidas de que ela era dominada, controlada, como que "hipnotizada" pelo marido; os sentidos aí estão congelados. Assim de acordo com a descrição jornalística, Karla não tinha controle sobre nenhum tipo de situação.

Ele a estava moldando nos remete à figura mitológica grega do rei de Chipre, Pigmaleão, que esculpiu em marfim, a mulher perfeita – Galatéia. Ajudado por Vênus e pela sua própria fé, a estátua, o fruto de seu sonho, se transformou em realidade, na mulher perfeita, na mulher "de verdade". Karla sabia que ela precisava se transformar para que o sonho do marido se tornasse realidade. Então, o efeito de Pigmaleão funciona para justificar o comportamento da mulher cega de amor que quer satisfazer a todas as vontades do ser amado para que a profecia se cumpra. Assim como a figura mitológica, é sugerido ao leitor que Karla foi construída a partir do sonho do seu criador. O efeito de sentido criado é o de que Karla não foi responsável por suas ações porque ela não tinha nenhum controle; era totalmente subordinada ao poder e ao controle masculinos, estando assim, em posição inferior. A ênfase nessa representação faz parte da política da diferença dos gêneros que constrói a identidade feminina como ingênua, passiva, não agressiva e como não pertencente ao mundo fora da esfera privada, da vida doméstica. Como ela poderia saber ou ser responsabilizada pelos atos praticados pelo marido fora de casa? Karla é retratada como sendo o recipiente de toda a violência masculina. Ela é a imagem da vulnerabilidade e da passividade, imagem da total submissão, na verdade é até difícil imaginar um grau maior de submissão uma vez que até chegou a cometer homicídios por ter sido, supostamente, vítima da violência doméstica, como deixa claro o excerto: "Homolka e os promotores alegariam posteriormente no julgamento que ela era vítima da "síndrome da esposa espancada", forçada a estuprar e a assassinar por causa do seu abuso físico e mental constante..."

Ao alegar ser vítima da "síndrome da mulher espancada", Karla busca dar uma explicação para a sua cumplicidade nos crimes de estupro e assassinato, isto é, ela própria era vítima do marido que também a violentava, espancava e torturava. A promotoria parecia concordar com essa teoria da defesa. Paul Bernardo tentava provar que a participação da esposa nos crimes teria acontecido de livre e espontânea vontade; ele afirmava que havia estuprado e "sodomizado" as duas adolescentes, porém Karla as teria matado. O jogo argumentativo que "criou" a imagem de Homolka como vítima pela defesa - imagem esta reforçada em um primeiro momento pela mídia -, serviu aos interesses da promotoria.

Os especialistas contratados pela promotoria – com um custo estimado de mais de $ 100.000 – retrataram Bernardo como o mais doente dos dois. Outros apontaram para o fato de que só o abuso poderia explicar o comportamento de Homolka. Em determinado momento ela teve que ser responsável por suas ações, eles disseram. Os psiquiatras mais tarde teorizaram que Homolka desenvolvera estratégias de sobrevivência para tentar reduzir o seu abuso. / Enquanto os especialistas tinham muitos problemas ao tentar analisar Homolka, aparentemente eles não tiveram nenhum problema ao tarjar Bernardo como uma pessoa com uma personalidade anti-social. Os psiquiatras mais tarde teorizaram sobre a dinâmica do relacionamento de Bernardo/Homolka naquele momento. O casal vivenciava uma fase de tensão crescente onde ele se utilizava de abusos físicos e verbais menores para conseguir o que queria enquanto ela tentava aplacá-lo para evitar maiores problemas. Através dela, ele encontrou um escoadouro para os seus anseios, uma pessoa que estava disposta a satisfazer todos os seus pervertidos desejos sexuaisO sistema legal confiou na psiquiatria para traçar o perfil criminoso de Karla, que se submeteu, na época de sua prisão, a muitas análises clinicas e averiguações. A confissão que aparece tanto nos consultórios de psicanálise quanto nos escritórios de advocacia, parece-nos que foi de fundamental importância para a construção da "personagem" legal de Karla como vítima. Pelo que pudemos depreender do caso Karla, ela "confessou" para a polícia, promotores, advogados e, para inúmeros profissionais das áreas "psi" (cf. McGILLIVRAY). A estratégia da utilização dos especialistas funcionou para reforçar o argumento de que Karla, ao atender aos pedidos do marido, se comportou da única maneira que uma pessoa vítima de abuso poderia se comportar.

Podemos verificar como o jogo argumentativo nos sugere que o comportamento criminal de Homolka é justificado, como se fosse um ato de legítima defesa, uma maneira de sobrevivência. Apesar de haver uma reprovação à conduta de Karla, ela teve que ser responsável por suas ações, nos passa mais a ideia de uma criança sendo "julgada" pelo pai que a irá repreender, mesmo que este queira perdoar o deslize de conduta. Karla é assim, mais uma vez, posicionada infantilmente. Portanto, mulher = criança = irresponsável.

Enquanto o público e a mídia tentavam decidir se estavam diante da mocinha-ingênua-esposa aterrorizada, da vítima da violência masculina forçada a cometer atos criminosos ou de uma criminosa sem arrependimentos que ajudou espontaneamente o marido para a satisfação dos seus próprios anseios sexuais, Homolka negociava com a promotoria o acordo que seria mais tarde conhecido como the deal with the devil (o acordo com o diabo); ela seria a testemunha-chave de acusação no julgamento de Bernardo e não poderia falar direta ou indiretamente com a mídia e nem obter nenhum tipo de lucro pelos crimes cometidos, como a venda da sua história, por exemplo.

A delação premiada garantiu à Karla Homolka - em meio a controvérsias - uma sentença de doze anos de reclusão quando se declarou culpada por homicídio culposo nas mortes das adolescentes Kristen French e Leslie Mahaffy e também pelo seu envolvimento na morte de sua própria irmã Tammy, que foi drogada e violentada pelo casal. Como inúmeras falhas de investigação - na autópsia, na análise de DNA e na parte ética, inclusive – haviam ocorrido, a delação premiada tornou-se um instrumento importante para a condenação do estuprador e assassino Paul Bernardo.

Na época do julgamento de Bernardo, várias fitas de vídeo gravadas pelo casal no período em que as meninas sequestradas estavam em seu poder foram apresentadas. Além dos atos criminosos praticados contra as adolescentes, uma Karla ativa e participante de tais atos também foi mostrada.

O acordo de Karla com a promotoria não foi tão criticado na época pela opinião pública, uma vez que a sua identidade estava representada como "vítima" e não "criminosa", estando assim, "justificados" os crimes praticados. A imprensa, fazendo um "mea culpa" começou a representá-la depois do julgamento de Bernardo como má e violenta. Karla, apesar de ter sido recebida, em um primeiro momento, no sistema correcional de maneira mais "branda" como a esposa-vítima - provando que a "demonização" leva a um tratamento carcerário mais duro - passou depois de algum tempo a cumprir pena em uma prisão de segurança máxima. Ela foi libertada em julho de 2005, depois de cumprir a pena integralmente e alguns meses antes da estréia do filme de Hollywood Karla, que conta a história criminosa do casal. Calculou-se na época um lucro de cem milhões de dólares com a exibição do filme sem a venda de um único ingresso de cinema ou DVD em solo canadense, onde foi boicotado. Paul Bernardo, considerado psicopata pelos especialistas, foi julgado e condenado - por homicídio doloso, entre outras tipificações legais - à prisão perpétua em confinamento solitário.

4. Considerações finais

Por meio da linguagem aprendemos a cultura preexistente de nossa comunidade. A cultura já nos é dada por esse sistema de representação que nos define a "realidade". De acordo com a visão foucaultiana, o discurso produz "saberes" e a sociedade "sabe" com ordenar os seus discursos, exercitando assim, o poder. Quem controla os discursos também define o que é "realidade" ou o que é "verdade", que varia de sociedade para sociedade, de cultura para cultura, de época para época. Isso se dá sempre de acordo com uma negociação e com os conflitos discursivos. Assim, a "realidade", numa visão pós-estruturalista, é o produto da negociação entre o texto (qualquer que seja ele, jurídico ou jornalístico) que é afetado por fatores sociais, pela história, pelos estereótipos e o leitor, no qual as categorias sociais são (re)definidas constantemente. 

Abordando o tema de maneira simples, a mídia coleta as informações que transmite ao público e, neste processo, ela escolhe, seleciona e decide o que é notícia e como contá-la. Assim, uma versão do que é "realidade" é transmitida ao público. A vitimização das mulheres foi a chave da narração jornalística do tema "violência contra as mulheres" na década de 1990. No entanto, ao narrar as histórias sobre os crimes através das biografias pessoais das vítimas, a mídia contribui para o processo de personalização evitando, assim, que uma discussão mais ampla e abrangente sobre os lugares da desigualdade seja realizada; fatores econômicos, de raça ou classe não são considerados.

A filósofa feminista FRENCH (1992), ao criticar a mídia, já alertara para o fato de ela tratar certos tipos de crimes como o incesto, o estupro e as agressões físicas, por exemplo, como se esses fossem aberrações individuais e não recorrentes de um sistema policial e jurídico que eram no mínimo, maleáveis com os crimes de violência contra as mulheres. Além do mais, através da descrição do abuso físico e das características biológicas e, portanto, não históricas, a ideia de que as mulheres são inferiores aos homens é considerada "natural" e "legítima".

Como sabido, o gênero é construído socialmente por meio da ordem da linguagem patriarcal. BUTLER (2003), afirma que, na verdade, o gênero é uma performance, aquilo que "faz" em determinados momentos e não o que se "é" no sentido universal. Assim, o conceito de "feminino" só existe dentro de uma concepção construída do que seja "feminino" assim definido pelo sistema cultural adquirido através da linguagem. Operando na visão foucaultiana, entende-se que vários discursos sobre a "verdade" dos sexos foram construídos e, como consequência, ao se institucionalizar um discurso sobre o gênero feminino, vários tipos de "saberes" foram produzidos, empobrecendo e controlando a experiência feminina dentro de certas imagens de sexualidade.

A mídia produz e reforça certos estereótipos considerados "positivos", tais como: a "mulher-esposa", a "mulher-objeto sexual", e a "mulher-criança", dentre outros, mas também representa as mulheres como perigosas e maléficas, o que "desafia" aqueles estereótipos "normais" "femininos". O estereótipo, nas palavras de HAll (1997), reduz, essencializa, naturaliza e fixa a diferença, separando o normal do anormal, o "eu" do "outro", e surge geralmente quando o poder é desigual e está direcionado contra o 15

subordinado ou o grupo excluído. HALL (1997) afirma que estereotipar é um tipo de jogo das relações de poder/saber, que caracteriza as pessoas de acordo com as normas sociais "construindo" o excluído como o "outro". Vimos como a mídia colaborou para a construção da identidade do sujeito "mulher" como uma vitima natural do poder masculino, e, portanto, subordinada a esse poder. A partir da definição do papel social da mulher - com as suas devidas "marcas femininas" -, as instituições sociais introduzem saberes que podem enfatizar determinados estereótipos femininos.

A mídia, que ora representa a mulher em posição de igualdade na sociedade, construindo a imagem da "supermulher" que simultaneamente é profissional, mãe, companheira, bonita, jovem e sexy - deixando a impressão de que o problema da desigualdade dos gêneros está resolvido -, ora representa a mulher como "vítima", oprimida e violentada pela sociedade patriarcal, identidade construída como marca da brutalidade e violência do homem - reforçando o estereótipo da "superioridade" biológica e da supremacia masculinas -, não escapa de apresentar as mulheres através dos estereótipos e/ou das categorias estanques, o que limita e fixa as identidades femininas, normalizando-as, mantendo-se o satus quo.

Os jornais, dessa maneira, funcionam como veículo ideológico de construção de conhecimento e, portanto, não são veículos neutros de transmissão de informações ou verdades, mas sim instrumentos de mediação entre os vários discursos que circulam na sociedade. Observaram-se alguns dos efeitos gerados quando certos estereótipos são desafiados na arena discursiva.

O discurso da "violência contra as mulheres" na mídia, homogeneiza a identidade "vítima", buscando firmar uma única identidade de "mulher", como se todas elas pertencessem à mesma classe socioeconômica, à mesma raça e etnia, enfim, como se todas elas fossem "iguais" e sofressem o mesmo tipo de violência. Seriam mesmo todas as mulheres vítimas naturais da violência masculina? CARMAGNANI (1996, p. 124) afirma:

Uma das características marcantes do discurso jornalístico é a imposição de uma homogeneização que cria e busca manter a ilusão de um sujeito uno, onisciente, um autor consciente de todos os passos de sua produção, Portanto, tudo o que é dito refletiria essa unicidade: a "realidade" objetiva do fato relatado, a objetividade no tratamento dado à notícia, a pasteurização dos textos (verbais e não verbais). 

O neoliberalismo legitima "mulher" como um dos agentes das mudanças estruturais ou dos sistemas sociais existentes e, em assim sendo, o feminismo, que trata de temas como a mulher no mercado de trabalho, a maternidade, o aborto, o lugar social e a violência estão em debate e fazem parte também de outras discussões levantadas por outros movimentos de minorias, como o dos negros e o dos homossexuais, entendendo que a violência é um obstáculo à justiça social.

A propaganda das causas feministas, bem como as alterações legais para as garantias dos direitos da mulher, são fundamentais para que as supostas mudanças sejam alcançadas. Nesse sentido, a criminologia que, como já visto, introduziu os tópicos da vitimização feminina em sua agenda e, através das abordagens contemporâneas, pesquisa sobre o papel desempenhado pelo encontro das múltiplas categorias e dos múltiplos "lugares de diferença" sociais no acometimento da conduta desviante, enfatiza, dessa maneira, toda a complexidade das "negociações" que ocorrem entre as "identidades" e as "diferenças" entrelaçando-as com as questões socioeconômicas.

No entanto, trabalhar com suposições estereotipadas sobre as mulheres pode gerar alguns efeitos para o sistema de justiça, como por exemplo, no caso das mulheres desviantes, que tendem a receber um tratamento mais duro quando caem no sistema judiciário criminal - se consideradas "demônios" ou "bruxas" -, ou um tratamento paternalista se consideradas vítimas, por exemplo. Observa-se ainda uma insistência das teorias criminológicas dominantes em afirmar que a "natureza" das mulheres as mantém afastadas da vida criminal, contrariando aquelas abordagens criminológicas mais críticas, pois que não evitam o problema do determinismo biológico e nem do reducionismo tão característicos das primeiras discussões sobre as causas dos atos delituosos. Seria a distância biológica entre os sexos tão distantes a ponto de se atribuírem certos comportamentos desviantes somente com base nos gêneros sexuais? E as outras características, tais como as psicológicas, morais e sociais?

Se é verdade que vivenciamos uma revolução no pensamento humano, com quebras de paradigmas, principalmente por causa dos novos sistemas conceituais que estão baseados na multilinearidade, no link e no network que afetam como o conhecimento humano é "catalogado", então não se pode aceitar as representações das mulheres já constituídas como verdades inquestionáveis. Tem-se que reconhecer que a representação negativa das mulheres, principalmente na cultura popular de massa, contribui para a objetificação e para uma sociedade violenta contra elas. A desconstrução dos sistemas representacionais de "mulher", "feminina" e "feminilidade" através das teorias críticas pode conduzir a uma melhor interpretação da constituição de suas identidades. Como estratégia política, a categoria - limitadora e rígida - "mulher" talvez seja grupo de "minoria", no entanto, há que se proporem reflexões sobre a "mulher" e as suas diferenças para entender como ela chegou a essa categoria histórica, a fim de que seja construída uma imagem mais positiva da subjetividade "feminina".

 

1Texto parcialmente alterado publicado originalmente no livro Criminologia e os problemas da atualidade. Alvino Augusto de Sá, Sérgio Salomão Shecaira organizadores. São Paulo: Atlas, 2008.

2 Graduação em direito com especialização em Direito Penal e Criminologia pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FDUSP), mestra e doutora em Letras Modernas no programa Estudos Linguísticos e Literários em Inglês pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) pela mesma universidade.

3 Os textos jornalísticos foram publicados no Canadá e foram escolhidos porque na década de 1990, a mídia canadense publicou de maneira ampla e abrangente as questões referentes à violência contra a mulher, como a violência doméstica, por exemplo. Isto tem a ver com a política do "politicamente correto" que foi vivenciado intensamente nesta década pela sociedade norte-americana, compreendida aqui como o Canadá e os EUA.

4 Esta campanha foi para a conscientização da população no sentido de que, se uma pessoa recusa-se a ter relações sexuais dizendo "não", ela quer dizer exatamente isso, e não que esteja praticando algum tipo de sedução ou jogo sexual. A própria definição de estupro sofreu alterações em função dessa nova política. 

5 A criminologia feminista se desenvolveu nos Estados Unidos a partir da segunda fase do movimento feminista, na década de 1960, porque os acadêmicos feministas liberais não estavam contentes com os estudos criminológicos que não incluíam as questões sobre a relação entre a desigualdade dos gêneros e os atos delituosos, limitando ainda o enfoque das teorias somente aos aspectos das desigualdades econômicas como fatores desencadeadores do cometimento dos atos desviantes. Assim, as criminologistas feministas protestavam contra a exclusão das experiências das mulheres das teorias.

O livro da autora ganhou o prêmio Pulitzer de jornalismo (traduzido para o português dez anos depois do seu lançamento nos EUA) mostra o papel central da mídia na década de 1980 que, de acordo com a pesquisa de Faludi, contribuiu para que as conquistas do movimento feminista fossem desacreditadas e rejeitadas. 
 
Uma matéria jornalística New York Times que ficou famosa, perguntava: "O Feminismo Morreu?".
 
As expressões entre aspas foram retiradas do artigo Hitting Home - Spousal Abuse: The Shocking Truth, encarte especial realizado com as matérias publicadas no jornal canadense The Toronto Star, de 09 a 16 de março de 1996.
 
Artigo publicado no jornal The Toronto Star em 02 de setembro de 1995, no caderno Insight.
 

3. Referências Bibliográficas

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OLIVEIRA, M. de Fátima Cabral Barroso de. A Mídia e as mulheres: feminismos, representação e discurso, 2005. Dissertação de Mestrado. USP, São Paulo. Disponível em: <www.teses.usp.br>.

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WOLF, Naomi. The beauty myth. Toronto: Random House of Canada, 1990.

Consultas

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COTÊ, Andrée, SHEEHY, Elizabeth e MAJURY, Diana. NAWL’s brief defense on provocation, 2000. Disponível em: <www.nawl.ca/provocation.htm>.

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THE TORONTO STAR. Vários exemplares da década de 1990.  

 

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