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Voz, Decisão, Poder e Gênero:provocações para o debate quanto à presença de Advogadas na Magistratura de Segunda Instância do TJ/SP

20/03/2020 - Fonte: ESA/OABSP

No mês das mulheres, a Escola Superior de Advocacia dá andamento ao 08 de março, com artigos de suas pesquisadoras trazendo reflexões sobre as dinâmicas de relação de gênero na advocacia.

Voz, Decisão, Poder e Gênero: provocações para o debate quanto à presença de Advogadas na Magistratura de Segunda Instância do TJ/SP

 

 

Renata Miranda*

Raíssa Musarra*

 

O Dia internacional da Mulher é comemorado no dia 8 de março. Apesar de já passada a data, é oportuno refletir sobre as dinâmicas de relação de gênero na advocacia. Como ponto de partida para a discussão, é conveniente elucidar as discrepâncias de gênero na profissão através da análise do alcance de espaços de voz, decisão e poder. Um critério objetivo pode ser o da promoção de advogadas pelo quinto constitucional em carreiras da magistratura, como exemplo.

Tendo como ponto de partida os percursos para se alcançar condições de ingresso na carreira, verifica-se que a primeira condicionante de acesso é a educação superior. De pronto, pode-se considerar que há desigualdade de acesso, vez que o ensino superior estava presente no Brasil desde 1808¹, contudo, apenas setenta e um anos depois, pelo decreto 7.247 de Abril de 1879, Dom Pedro II autorizou que mulheres acessassem o ensino superior²

É importante apontar que há outras privações quando inserido o elemento raça, já que neste período a escravidão ainda vigia. Assim, o acesso à educação aos negros, e no caso específico, às mulheres era muito mais restrito³.

O caminho para a equidade no trabalho tem sido uma construção coletiva, institucionalizada, em partes, por influência das Convenções da Organização Internacional do Trabalho, tais como as Convenções: 3, Relativa ao Emprego das Mulheres antes e depois do parto (Proteção à Maternidade), adotada na OIT em 1919 e ratificada pelo Brasil apenas em 1934; 4, Relativa ao Trabalho Noturno das Mulheres, adotada pela OIT em 1934, com ratificação no Brasil em 1936; a Convenção 89, Trabalho Noturno das Mulheres na Indústria, adotada pela OIT em 1948 e ratificada pelo Brasil em 1957; Convenção n. 100, sobre Igualdade de Remuneração de Homens e Mulheres (Trabalhadores por Trabalho de Igual Valor), com adoção na OIT em 1951 e ratificação no Brasil em 1957; Convenção 111, sobre Discriminação em Matéria de Emprego e Ocupação com adoção na OIT em 1958 e ratificação no Brasil apenas em 1965. Até o atraso nas ratificações pelo Brasil denuncia nosso lento desenrolar em matéria de igualdade de gênero.

Tal disparidade impactou as possibilidades de profissionalização, e , apesar disso,  contemporaneamente, o número de mulheres advogadas no Estado de São Paulo é 161. 944, superior ao número de advogados, que é de 161.5734

Contudo, a reflexão que conduz a escrita é: 

Em que espaços essas mulheres advogadas estão atuando? 

Estas acessam com igualdade de gênero os cargos disponíveis à carreira? 

A este respeito, conforme dados do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, o quadro de desembargadorxs que o compõe até março de 2020 é de 26 mulheres e 331 homens, totalizando 357 desembargadorxs5

No que tange à nomeação de advogadas pelas vias do quinto Constitucional, dos desembargadores presentes no TJSP até março de 2020, 36 pessoas foram indicadas pelo quinto Constitucional provindos da advocacia, destes, apenas 8 são mulheres, 28 são homens6. Ou seja, apesar de haver número similar no que diz respeito a gênero no quadro de advogados, a nomeação para cargos de mais alto salário e com poder de decisão não ocorre de forma equânime.

Tal discrepância em relação a gênero entre os nomeados pelo 5º constitucional da Advocacia  manifesta-se como resquício histórico do patriarcado que marca as construções de laços sociais em relação a espaços e papéis e, assim, mantém viva uma estrutura hierárquica que faz com que, mesmo sendo maioria na base, os cargos de comando sejam reservados aos homens, resultando na disparidade da promoção de mulheres aos mesmos, que, além de lenta é desigual e apresenta entraves peculiares de gênero.

Assim, apesar das conquistas alcançadas pela atuação de mulheres, inclusive das mulheres advogadas - com novidades introduzidas na definição de cotas para palestrantes no órgão7 e dos avanços na discussão sobre atuação das mulheres quanto a prerrogativas, participação da mulher na política e no sistema OAB, promoção da igualdade de gênero e desafios da carreira8 -, os resultados apontam que ainda este dia, ou este mês, aquém de comemoração, deve servir como memorium que direcione o desenvolvimento de políticas de igualdade, para que no presente e no futuro, instituições e sociedade alcancem a concretização material de igualdade de gênero.

A ESA parabeniza toda a classe advogadxs despertxs para a luta por igualdade de gênero, em especial as mulheres advogadas por sua atuação na defesa de Direitos e busca por uma sociedade mais justa e igualitária.

___
* Pesquisadoras da Escola Superior de Advocacia - ESA/OABSP. 
SAMPAIO, H. Evolução do ensino superior brasileiro (1808-1990). Documento de Trabalho 8/91. Núcleo de Pesquisa sobre Ensino Superior da Universidade de São Paulo, 1991.
 SÃO PAULO, Decreto n° 7.247 de 19 de abril de 1879. Reforma o ensino primário e secundário no municipio da corte e o superior em todo imperio. 1879. Disponível no site: . Acesso em: 18/03/2020.
SÃO PAULO. Regulamento de 22 de agosto de 1887 da província do Estado de São Paulo. “Regulamento para instrucção publica Provincial 1887”. Disponível no site: < http://www.usp.br/niephe/bancos/legis_detalhe.asp?blg_id=205>. Acesso em: 18/03/2020.
4 Ordem dos advogados do Brasil- OAB/Federal. Institucional. Quadro de advogados quantitativo por gênero. Disponível em: <https://www.oab.org.br/institucionalconselhofederal/quadroadvogados
SÃO PAULO. Lista de antiguadade de segundo Grau TJSP, 2020. Disponível em: <http://www.tjsp.jus.br/Download/Magistrados/ListaAntiguidadeSegundoGrau.pdf?d=1584563181351

>. Acesso em: 18/03/2020.

Ibidem.
7 Sistema OAB adota cota para participação da mulher advogada em todos os seus eventos. Disponível em: http://www.oabsp.org.br/noticias/2020/02/sistema-oab-adota-cota-para-participacao-da-mulher-advogada-em-todos-os-seus-eventos.13394.
Painéis debatem prerrogativas, desafios da carreira, igualdade de gênero e participação no sistema OAB na a III Conferência Nacional da Mulher Advogada. Disponível em: https://www.oab.org.br/noticia/57961/paineis-debatem-prerrogativas-desafios-da-carreira-igualdade-de-genero-e-participacao-no-sistema-oab
 
 

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