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Prerrogativas do Advogado

15/03/2022 - Fonte: Esa

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PRERROGATIVAS DO ADVOGADO 2[1]

 

1.         O inciso XXI do art. 7º, Lei 8.906/1994, revela, como prerrogativa advocatícia:

 

Art. 7º São direitos do advogado:

 

XXI – assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração:[...][2]

 

2.         Assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações significa atuar como advogado; atuar como advogado do suspeito, do investigado, do indiciado, do denunciado, do réu, do preso. Nos termos do art. 1º, Lei 8.906/1994, que estabelece:

 

Art. 1º São atividades privativas de advocacia:

 

I – a postulação a órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais;

 

II – as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas.

 

3.         O sigilo não pode – e não deve[3] –, ser oposto ao advogado, ressalvado, todavia, no ponto, o enunciado da Súmula Vinculante 14/STF; enunciado da Súmula Vinculante 14/STF que não diz respeito ao sigilo, em si, e, sim, à eficácia das diligências policiais em andamento:

 

É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.

 

4.         O acesso, pelo defensor técnico, no interesse do investigado, aos autos do inquérito policial e ou do processo judicial de conhecimento ou de execução, portanto, é livre e independe da existência do instrumento do mandato. Ou seja, à autoridade policial ou judicial é vedado exigir do profissional da advocacia a juntada imediata do instrumento do mandato. Desde que o advogado, ao pedir o acesso aos autos da persecução, tenha acionado expressamente o art. 5º, caput e § 1º, Lei 8.906/1994:

 

Art. 5º O advogado postula, em juízo ou fora dele, fazendo prova do mandato.

 

§ 1º O advogado, afirmando urgência, pode atuar sem procuração, obrigando-se a apresentá-la no prazo de quinze dias, prorrogável por igual período.

 

5.         A regra acima destacada – uma verdadeira prerrogativa advocatícia, apesar de deslocada do rol do art. 7º, Lei 8.906/1994 –, tem enorme valia e eficácia ímpar. À medida que permite o acesso, pelo advogado – e acesso imediato, diga-se –, aos autos de qualquer investigação e ou processo judicial, no interesse da pessoa submetida à persecução, penal e ou administrativa, instaurada perante qualquer estrutura de poder. Aí incluídas as pesquisas em trâmite perante as agências executivas estaduais, ou federais, ou as polícias, se se preferir. No STF:

 

O que não se revela constitucionalmente lícito, segundo entendo, é impedir que o indiciado tenha pleno acesso aos dados probatórios, que, já documentados nos autos (porque a estes formalmente incorporados), veiculam informações que possam revelar-se úteis ao conhecimento da verdade real e à condução da defesa da pessoa investigada (como no caso) ou processada pelo Estado, ainda que o procedimento de persecução penal esteja submetido a regime de sigilo. (...) Sendo assim, em face das razões expostas, e considerando, ainda, os fundamentos que venho de mencionar, defiro o pedido de medida liminar, em ordem a garantir, ao ora reclamante, por intermédio de seu advogado regularmente constituído (...) o direito de acesso aos autos de inquérito policial no qual figura como investigado (...).[4]

Do plexo de direitos dos quais é titular o indiciado – interessado primário no procedimento administrativo do inquérito policial –, é corolário e instrumento a prerrogativa do advogado, de acesso aos autos respectivos, explicitamente outorgada pelo Estatuto da Advocacia (L. 8906/94, art. 7º, XIV), da qual – ao contrário do que previu em hipóteses assemelhadas – não se excluíram os inquéritos que correm em sigilo: a irrestrita amplitude do preceito legal resolve em favor da prerrogativa do defensor o eventual conflito dela com os interesses do sigilo das investigações, de modo a fazer impertinente o apelo ao princípio da proporcionalidade.

 

A oponibilidade ao defensor constituído esvaziaria uma garantia constitucional do indiciado (CF, art. 5º, LXIII), que lhe assegura, quando preso, e pelo menos lhe faculta, quando solto, a assistência técnica do advogado, que este não lhe poderá prestar se lhe é sonegado o acesso aos autos do inquérito sobre o objeto do qual haja o investigado de prestar declarações.

 

O direito do indiciado, por seu advogado, tem por objeto as informações já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução de diligências em curso (cf. L. 9296, atinente às interceptações telefônicas, de possível extensão a outras diligências); dispõe, em consequência, a autoridade policial, de meios legítimos para obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado e seu defensor dos autos do inquérito policial possa acarretar à eficácia do procedimento investigatório.[5]

 

6.         É nesse patamar que tem de ser analisado o eventual indeferimento, pela autoridade, do acesso, aos autos, pelo advogado. Porque tal indeferimento viola abertamente a prerrogativa prevista no art. 7º, XXI, Lei 8.906/1994 e, no limite, o próprio Estado Democrático de Direito – ou a República, em sentido estrito, caso se queira –, fundado nos postulados da cidadania e da dignidade da pessoa humana. Dado que a estratégia defensiva, tarefa que toca, com absoluta exclusividade, ao advogado[6], fica impedida quando o acesso à investigação, ou aos autos do processo judicial, se lhe é obstado. Vale repetir que não há campo propício à exigência da juntada, pelo profissional da advocacia, do instrumento do mandato[7]. Tampouco a invocação de sigilo – que surge sempre no campo da excepcionalidade maior e não como regra[8] – pode ser oposta ao advogado, pela autoridade, policial ou judicial.

 

7.         Mesmo assim, no caso de indeferimento, o que fazer? O habeas corpus repressivo, com pedido de medida liminar, é o meio mais eficaz e rápido para restabelecer o direito de acesso imediato, aos autos, pelo advogado. Independentemente da existência de sigilo e do instrumento do mandato.

                  

            Alexandre Langaro, advogado criminal. Autor de livros e artigos jurídicos. Estudou o NY Criminal Procedure Law em Nova Iorque. Membro da Comissão de Defesa, Assistência e Prerrogativas dos Advogados da Seccional do Rio Grande do Sul da Ordem dos Advogados do Brasil.

 


[1][STF, AP 470: “E prerrogativa, nós sabemos que é direito [público] subjetivo especial, porque conferido, não a uma série aberta de pessoas, mas a uma série fechada. No caso, há uma série fechada de profissionais para que eles exerçam o múnus advocatício com desembaraço e altivez” (A palavra público, entre colchetes, foi inserida pelo autor deste artigo)].

[Alexandre Langaro, O Estado de São Paulo (https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/prerrogativas-do-advogado%C2%B9/)].

[2][Grifos aditados].

[3][Constituição federal

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

[4][Rcl 8225/SC].

[5][RTJ 191/547 e 548].

[6][Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil:

Art. 11. O advogado, no exercício do mandato, atua como patrono da parte, cumprindo-lhe, por isso, imprimir à causa orientação que lhe pareça mais adequada, sem se subordinar a intenções contrárias do cliente, mas, antes, procurando esclarecê-lo quanto à estratégia traçada.

Art. 23. É direito e dever do advogado assumir a defesa criminal, sem considerar sua própria opinião sobre a culpa do acusado. Parágrafo único. Não há causa criminal indigna de defesa, cumprindo ao advogado agir, como defensor, no sentido de que a todos seja concedido tratamento condizente com a dignidade da pessoa humana, sob a égide das garantias constitucionais].

[7][Lei 8.906/1994

Art. 5º O advogado postula, em juízo ou fora dele, fazendo prova do mandato.

§ 1º O advogado, afirmando urgência, pode atuar sem procuração, obrigando-se a apresentá-la no prazo de quinze dias, prorrogável por igual período].

[8][Constituição federal

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: […] (grifado por conta)].

 

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