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O crime de feminicidio: Considerações históricas e jurídicas: Parte I

11/03/2021 - Fonte: ESA/OABSP

As autoras Marina Dantas Fernandes e Silva, Luciana Maria de Araújo Nascimento e Renata Miranda Lima escreveram artigo que objetiva, tratar dos direitos adquiridos pelas mulheres ao longo dos séculos através de suas lutas por direitos como o direito ao voto, ao trabalho em condições de igualdade. Esperamos que o estudo possa subsidiar informações para o debate acadêmico do tema.

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O crime de feminicidio: Considerações históricas e jurídicas: Parte I

The crime of feminicide: Historical and legal considerations: Part I

 

Luciana Maria de Araújo Nascimento

Marina Dantas Fernandes e Silva

Renata Miranda Lima


 

Resumo: O presente artigo tem por objetivo, tratar dos direitos adquiridos pelas mulheres ao longo dos séculos através de suas lutas por direitos como o direito ao voto, ao trabalho em condições de igualdade, etc. Apesar da longa caminhada por igualdade, como resquícío das desigualdades de gênero, mulheres ainda figuram nas maiores taxas de homicídio em razão do seu gênero. Diante desse contexto, define-se como problemática de pesquisa a analise dos principais motivos que sofragam a concretização dos direitos protetivos das mulheres. Para tanto, a pesquisa se iniciará tratando do contexto histórico do princípio à igualdade, bem como o que leva ao grande número de mortes de mulheres em razão da sua condição de ser mulher.

 

Palavras-chave: Feminicídio; Violência; gênero; direitos; dignidade humana; Direito à Igualdade.

 

Abstract:  The purpose of this article is to address the rights acquired by women over the centuries through their struggles for rights such as the right to vote, to work on equal terms, etc. Despite the long journey towards equality, as a consequence of gender inequalities, women still figure in the highest homicide rates due to their gender. In this context, research analysis is defined as the analysis of the main reasons for the realization of women's protective rights. To this end, the research will begin by addressing the historical context of the principle of equality, as well as what leads to the large number of deaths of women due to their condition of being a woman.

Keywords: Femicide; Violence; genre; rights; human dignity; Right to Equality.

 

Falar sobre a história das mulheres não é uma tarefa fácil uma vez que envolve muitos  povos e culturas e Mocellin em seu livro sobre a história das mulheres destaca a grande importância que teve o movimento feminista da década de 1960 onde a relação entre os sexos passa a ser analisada a partir da categoria de gênero em que ocorre o afastamento da distinção entre os sexos marcada apenas por critérios biológicos ja que o que define os papéis do homem e da mulher é uma construção social e que tem se construído de diversas maneiras ao longo do tempo. A mulher tem sido encarada de diversas formas ao longo da história da humanidade. Mocellin afirma que quando se analisa a história, percebe-se que ela é feita de avanços e retrocessos e com relação as mulheres ocorreram tanto avanços quanto retrocessos.

O autor assevera que apesar de todos os avanços as mulheres tem sido vítimas de muitos abusos e injustiças mutilações, falta de direitos politicos, escravidão sexual e, casamentos forçados (Mocellin, 2014, p. 5.)  

Não existiu uma história das mulheres linear pois em cada cultura a mulher foi vista e tratada de diferentes formas, ora gozando de amplas liberdades como no caso das mulheres da Antiga Creta ora situações de opressão como foi o caso das mulheres Hebreias após o exílo babilonico. 

Ainda destaca-se que “mesmo  na idade moderna – época de notáveis conquistas materiais e científicas- milhares de mulheres foram queimadas em fogueiras inquisitoriais nos países catolicos (Mocellin, 2014, p. 6).  

As mulheres tem sido vítimas de sofrimentos e injustiças no mundo todo ao longo da história da humanidade e o lugar que elas tem ocupado é fruto de uma construção histórica e cultural  e, portanto, é importante conhecer o passado para entender a realidade das mulheres na atualidade uma vez que muito da mentalidade do passado ainda permanece e influencia na vida de milhares de mulheres (Mocellin, 2014) o que é entitulado pelas autoras Lima e Temer como a perpetuação das velhas formas de viver (Lima; Temer, 2020. p. 10).

Assim, se na história das mulheres tem muitas injustiças, violência e opressão tal realidade não é uma simples lembrança do passado visto que hoje , século XXI milhares de mulheres são vitimas de violência doméstica e morrem em função do feminicídio.  Diante desse cenário considera-se que esse é tema que precisa ser falado e debatido para ser compreendido pela sociedade como um todo.

Ainda quanto a história das mulheres, é importante destacar que essa é riquíssima e diversificada especialmente no que tange a história da mulher Brasileira, quanto as suas lutas, suas conquistas e o longo caminho que percorreu para chegar até aqui no seculo XXI. 

Priore nos diz que no Brasil ainda precisamos de muitas pesquisas que iluminem o papel da mulher nas diversas épocas e culturas sendo que ela fala de um período que cobre quatro séculos e muitos são os questionamentos. Ela nos pergunta:  Para que serve a historia das mulheres? Responde que é para fazê-las existir, viver e ser (Prioli, 2006, p. 9). 

Assim, é preciso entender tanto do ponto de vista social quanto o histórico para depreender as razões que levam à tanta violencia contra as mulheres que no caso em tela se específica no crime de feminicídio.

 

O crime de feminicídio como resultado da desigualdade de gênero 

 

Antes de qualquer coisa se faz necessário definir o que significa o termo feminicídio. No livro feminicídio invisibilidade mata  o feminicidio é colocado como sendo “o assassinato de mulheres em contextos marcados pela desigualdade de gênero”(PRADO; SAMEMATSU. 2017, p. 9).

Scott define gênero como uma forma de indicar construções culturais , segundo a autora o significado do que significa ser homem ou mulher, ou seja, os papeis que cada um deve desempenhar numa sociedade, é uma construção social (SCOTT. 1988, p. 75).

O feminicídio é um crime de ódio que surge como resultado de uma série de violências e opressão pela qual é submetida a mulher.

Femicídio ou feminicídio são expressões utilizadas para denominar as mortes violentas de mulheres em razão de gênero, ou seja, que tenham sido motivadas por sua condição de mulher. O conceito de femicídio foi utilizado pela primeira vez na década de 1970, mas foi nos anos 2000 que seu emprego se disseminou no continente latino-americano em consequência das mortes de mulheres ocorridas no México, país em que o conceito ganhou nova formulação e novas características com a designação de feminicídio (MENICUCCI et al, 2016, p.20).

Assim, embora o conceito tenha surgido a algumas décadas, apenas recentemente passou a ser incorporado as leis de diversos países e do Brasil com a lei 13.104/2015 que alterou o artigo 121 do Código Penal para prever o feminicídio como circunstancia qualificadora do crime de homicídio , assim , incluiu o inciso VI, ao seu parágrafo 2° in verbis:

FEMINICÍDIO

VI - Contra a mulher por razões da condição de sexo feminino (BRASIL, 2015)

Conforme especificado na lei 8.072/90 em seu art.1°, inciso I o crime supramencionado se configura nos moldes de crime hediondo (BRASIL, 1990). Dessa forma o regime de cumprimento da pena é diferenciado e mais gravoso.

A pena para o crime de feminicídio é aumentada de 1/3 até metade se cometido durante a gestação ou 3 (três meses) posteriores ao parto, contra menor de 14 ou maior de sessenta ou pessoa com deficiência ou na presença de descendente ou ascendente da vítima, conforme § 7 , I, II e III  do art. 121 do Código Penal. 

A lei é de extrema importância pois trata-se de um crime que envolve um profundo menosprezo pela mulher, discriminação e violência doméstica e familiar.  Assim, trata-se de um crime que envolve fatores sociais e culturais, ou seja, apenas a existência da lei não é suficiente para combater esse tipo de crime onde a mulher é vista como propriedade do homem.  

REFERENCIAS

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BRASIL. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Último acesso de 11 de agosto de 2020

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Viva: vigilância de violências e acidentes, 2006 e 2007 / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Análise de Situação de Saúde. – Brasília: Ministério da Saúde

BRASIL. Lei 13.104/2015. Dispõe sobre o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de feminicídio. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13104.htm>. Último acesso de 11 de agosto de 2020

BRASIL. Lei nº EL000552018, Disponível em <https://www.cml.pr.gov.br/cml/site/leidetalhe.xhtml?leicodigo=EL000552018>. Último acesso de 11 de agosto de 2020.

BRASIL. MINAS GERAIS - Ipatinga. Lei nº 3.491/2015. Disponível em: <https://www.ipatinga.mg.gov.br/abrir_arquivo.aspx?cdLocal=5&arquivo={EACA8C15-0CB1-DEBE-C1EC-4E48A36E7BCC}.pdf>. Último acesso de 11 de agosto de 2020

BRASIL. Convenção de Belém do Pará. (Adotada em Belém do Pará, Brasil, em 9 de junho de 1994, no Vigésimo Quarto Período Ordinário de Sessões da Assembléia Geral). Promulgado no Brasil pelo Decreto 1.973 de 1º de agosto de 1996.  Artigo 8º B. Disponível em: <http://www.cidh.org/Basicos/Portugues/m.Belem.do.Para.htm>. Último acesso de 11 de agosto de 2020

 

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